1)
O que faz você tematizar a ecologia?
A
preocupação talvez tenha a ver
com a minha própria biografia. Fui criado
no interior. A família tinha um pequeno
sítio de 4 hectares, do qual tínhamos
que tirar a base do sustento da família
através de muito trabalho. Importava
cuidar bem de cada parte da área para
que se mantivesse dentro de padrões auto-sustentáveis
de produção e reprodução.
Depois, já no tempo de estudante, na
década de 1980, um programa do Conselho
Mundial de Igrejas chamado Justiça, Paz
e Integridade da Criação ajudou
a criar conceitos mais específicos sobre
o tema. Já na década de 1990,
atuando como pastor no Rio de Janeiro, a participação
em comissões de trabalho, especialmente
nos preparativos de um Grupo de Trabalho para
o Fórum Mundial aprofundou a questão.
E, obviamente, muitos livros... Aí foi
ficando claro que não era mais um tema,
mas um tema central. Em suma, havia o vínculo
com a terra, que se expressava por uma busca
por sabedoria, e muita leitura boa.
2)
Você acha que a Bíblia seja importante
na luta pela preservação da natureza?
Por quê?
A
Bíblia enquanto obra teológica
tem suas intenções próprias
e específicas. Ela é também
um livro de memórias históricas
de um povo e de comunidades. Na confluência
de várias intencionalidades, também
a questão ecológica aí
está presente, talvez como um questão
secundária, talvez até como um
centro, porque nos textos da Bíblia trata-se
o tema da vida como tema central. Hoje, no desvario
humano, na luta por preencher as necessidades
e sobretudo os infinitos desejos, é importante
construir mecanismos de pensamento em que se
proponha uma vida com mais sabedoria em relação
ao meio ambiente. Isso pode ser feito por vários
caminhos. O caminho através da religião,
da fé e da espiritualidade é um
dos caminhos. Assim, acho importante resgatar
o que este livro tem de tradições
ecológicas. Por vezes, alguém
é capaz de ser mais sensível à
questão ecológica pelo fato de
estar mencionada no seu livro mais sagrado.
3)
A quais compromissos concretos, pessoais e comunitários,
os textos bíblicos lidos em perspectiva
ecológica, podem nos levar?
Acho
que fundamentalmente trata-se de criar a idéia,
biblicamente assentada, de que nós seres
humanos somos parte de uma comunidade da criação.
Falar de criação já é
um falar teológico! Assim, podemos ajudar
a manter ou criar o vínculo cósmico
e talvez superar a miopia e o egoísmo
antropocêntrico. Penso que as comunidades
religiosas, as igrejas deveriam achar alguma
forma de ir ensaiando na prática o fato
de que são campo de experiência
do Espírito, da fé. Por exemplo,
a dimensão do cuidado mútuo deveria
receber bastante atenção nas celebrações.
Também algumas questões ‘ecológicas’
no sentido do uso de materiais recicláveis
e o destino de materiais para a reciclagem poderiam
ser passos concretos.
4)
Quais as motivações que levaram
à fundação da ABIB –
Associação Brasileira de Pesquisa
Bíblica?
No
Brasil não havia uma entidade que pudesse
congregar formalmente as pessoas que trabalham
com a pesquisa da Bíblia nas mais diversas
instâncias, mas sobretudo da academia.
Havia e há muitas formais informais de
encontros, em assessorias, etc. Mas faltava
uma entidade academicamente organizada para
criar esse vínculo formal entre pessoas
que pesquisam a Bíblia sob os mais diversos
enfoques. O I Congresso Brasileiro de Pesquisa
Bíblica realizado em Goiânia nos
dias 4 a 6 de setembro de 2004 foi o nascedouro
da associação. Depois do congresso
uma comissão menor tratou de cuidar dos
trâmites legais para a constituição
jurídica da ABIB. Cabe ressaltar que
a ABIB pretende ser um espaço aberto,
ecumênico, diverso. Pesquisadores e pesquisadoras
de várias tendências e tradições
podem aí encontrar um lugar de partilha
e aprendizado. Mas é importante ter abertura
para a diversidade, para o outro, a outra.
5)
Quem pode fazer parte da ABIB?
Da
ABIB podem fazer parte pessoas que trabalham
com a pesquisa da Bíblia e seus campos
conexos. Inicialmente se pensou numa ‘sociedade
acadêmica’, mas na assembléia
durante o I Congresso se decidiu por um ingresso
e pertença menos formal, necessitando
que a pessoa mostre o interesse de participar
e que o seu interesse seja manifestado e referenciado
por algum conselheiro regional da ABIB.
6)
Qual a periodicidade e importância dos
congressos brasileiros de pesquisa bíblica?
Decidiu-se
que os congressos serão realizados a
cada dois anos. Realizamos os dois primeiros
em Goiânia por uma questão de afinidade
por parte da equipe encarregada dos trâmites
legais e, mesmo que distante, porque a Universidade
Católica de Goiás proporcionou
bons espaços e infra-estrutura para os
encontros. Neste sentido, há que se agradecer
a reitoria da Universidade em Goiânia
por tal apoio. O próximo congresso, isto
é, o terceiro, está marcado para
o ano de 2008. Falta precisar exatamente a data
e o local. Pensamos que São Paulo ou
Rio de Janeiro poderiam ser excelentes opções.
Há que se ver as iniciativas dos grupos
locais antes de tomar a decisão. Sobretudo
é importante ter uma instituição
que acolhe o congresso, possibilitando, assim,
a infra-estrutura básica para o evento.
7)
Quais os temas discutidos nesses eventos?
O
I Congresso teve como tema “Hermenêuticas
Bíblicas”. Buscou-se fazer uma
espécie de mapeamento das tendências
no estudo e na interpretação da
Bíblia no Brasil. Assim, houve exposições
sobre a trajetória da leitura popular
e ecumênica da Bíblia, perspectivas
a partir do mundo evangelical, do judaísmo
e também por parte das mulheres, na leitura
feminista da Bíblia. Convidamos também
um pesquisador alemão para chamar das
tendências na Europa.
No II Congresso, o tema foi “Êxodo,
libertação e liberdade”.
O objetivo era buscar delinear novos acessos
ao tema central da Bíblia, especialmente
do Antigo Testamento, que é o êxodo.
Em cada congresso, além das conferências
principais, verifica-se uma riqueza muito grande
através das ‘comunicações
científicas’, isto é, a
exposição de recortes de pesquisas
que vem sendo feito em vários lugares,
especialmente por conta de trabalhos monográficos,
de especialização, mestrado e
doutorado.
8)
O que motivou você a procurar a Editora
Oikos para publicar seus livros?
Pessoalmente
fiquei sabendo da Editora Oikos através
do lançamento do livro “Profecia
e esperança – um tributo a Milton
Schwantes”, lançado neste ano em
homenagem a este importante e fundamental pesquisador
e animador na pesquisa da Bíblia no Brasil
e na América Latina. A Editora Oikos
tem um jeito ágil de trabalhar, os materiais
editados são feitos com zelo e cuidado
técnico. O escritor tem boa assessoria
por parte dos editores, Erny Mügge e Iria
Hauenstein, que cuidam de todos os detalhes
formais. Por enquanto ainda é uma editora
que publica por demanda, ficando a comercialização
por conta do autor. Creio que em breve isso
haverá de mudar. Em geral, os prazos
nas grandes editoras são muito longos.
Além disso, livro teológico não
se vende muito no Brasil. Mesmo uma editora
de porte nacional por vezes leva anos até
vender mil exemplares. Assim, meio ao jeito
do antigo colportor, o autor acaba vendendo
mais livros através de palestras, encontros,
etc. E importante: acaba vendendo o livro por
um preço muito mais acessível!
Mas é importante a Editora Oikos ajudar
a criar uma rede de pessoas que, solidariamente,
ajudam na venda dos materiais, especialmente
na área bíblica, pelo Brasil afora.
(Outubro 2006)